No passado, era figura certa e atuante do ancionato da igreja. Porém a dureza implacável do tempo havia corroído algumas de suas funções vitais, ainda que parcialmente. Assim tinha dificuldades latentes, como incontinência urinária em proporção pequena, mas o suficiente para trazer-lhe um aroma por vezes desagradável. Os irmãos logo perceberam as mazelas da idade, e como sabiam que trabalhar para Cristo lhe era importante atribuíam a ele funções cada vez menores, até que simplesmente ficava de pé na porta da igreja como um diácono perene. Sem reclamar, aceitou o fardo do tempo, disperso em suas ações e observações que eram cada vez menos notadas ou acolhidas. Sentia-se menosprezado, mas sabia que era natural da vida, que quase aproximava do pôr-do-sol de sua existência. Conservara, todavia, dois aspectos capitais: a alegria constante e a fé no Senhor dos exércitos.
Sempre estava na igreja, nos ensaios de louvores, nas reuniões, nos batismos... Era constante em todos os cultos e todos tinham se acostumado com sua presença, mesmo sem dar muito valor aquele senhor uqe já se fazia quase parte do cenário congregacional. Alguns até lhe dispensavam, em parcas situações, alguma atenção, dando-se a consertar as dobras desiguais da manga de sua camisa ou a gravata mal empostada, frutos de disfunções visuais. Foi assim que tudo se seguiu até uma noite quente de sábado, onde no início de uma vigília, uma senhora que estava tomando estudos bíblicos, foi tomada de assalto por espírito imundo às portas do templo. Foi rapidamente levada para dentro, mas, os mais jovens puderam ver o horror daquela cena e o pastor decidiu rapidamente com o primeiro ancião levar a senhora (diante de muita luta) para uma sala reservada e começar um ciclo de oração e louvor, buscando expulsar o intruso daquele corpo feminino, já abatido de tanta luta.
Solicitou-se que toda igreja no salão principal permanecesse em oração, pedindo pela senhora possessa, o que foi prontamente seguido, e alguns membros considerados especialmente capacitados, bem como dois pastores casualmente presentes, foram também chamados à restrita sala. Mas enquanto oravam aquela situação dantesca se mantinha. O espírito imundo tomava conta do corpo daquela mulher e se punha a escarnecer dos presentes, e se por vezes se mantinha calado, até então não manifestara o melhor desejo de partir. O pastor mais experiente afirmou que era necessário que os presentes confessassem os próprios pecados e perdoassem imediatamente seus rancores, ou, ao invés de ajudar, apenas estariam atrapalhando. Seguindo o que foi proposto alguns pecados foram confessados e mesmo algumas rusgas perdoadas ali mesmo. Na prática, porém o efeito foi nulo. Nem as orações da igreja em conjunto, nem aquela atuação restrita na sala faziam efeito algum, parecia que aquele espírito era imensamente forte e nada podia detê-lo.
Neste ínterim, alguém foi designado para telefonar a um pastor especialista neste assunto, enquanto saiu para cumprir a missão passou a outro membro o que estava acontecendo. Graças ao bom Deus, o ouvido do nosso estimado irmão Vasconcelos ainda funcionava muito bem, e, ao ouvir o que falava o outro irmão sobre a gravidade do que estava acontecendo, calmamente se dirigiu à sala, mesmo sem ser chamado para tal. Foi até advertido por um dos diáconos para que retornasse à nave, mas, fingindo não ouvir, entrou na sala onde aquele triste fato continuava acontecendo. De forma muito decidida, aproximou-se da mulher e antes que qualquer reprovação pessoal pudesse ser proferida por aquela criatura espiritual repugnante, pegou a senhora pelo braço e disse:
- Como filho de Deus e em nome de Jesus, eu te ordeno, saía. Agora!...
Surpresos, os presentes viram a feição da mulher mudar e esta jogar-se ao solo exausta. Enquanto isso o irmão Vasconcelos voltava calmamente ao seu posto na porta da igreja e os presentes souberam então, naquele instante e para sempre, o real sentido de uma palavra: AUTORIDADE.
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